Qui, 26/12/2019 - 09:27
Em Trás-os-Montes, na Terra Fria, a quadra natalícia é vivida como em mais nenhum ponto do país através das festividades em honra de Santo Estêvão, também conhecidas como “Festa dos Rapazes”. Qualquer festa de Santo Estêvão é organizada por rapazes e, dependendo da aldeia onde se celebra, integra diversos rituais, com origens remotas. Estas festividades inserem-se no âmbito das celebrações do primeiro ciclo das festas de inverno e, segundo António Tiza, presidente da Academia Ibérica da Máscara, não podemos apenas cingir-nos ao Santo Estêvão, que se assinala hoje, mas sim a um ciclo de 12 dias, que começou ontem e se estende até ao dia de reis. "Acontecem vários rituais: há aldeias que têm a crítica social, um ritual formal, em que os caretos sobem a um determinado ponto elevado e proclamam acontecimentos, em verso, ridicularizando e apontando o nome das pessoas que os protagonizaram; todas elas têm as visitas formais a todas as casas da aldeia; a corrida à rosca, dois a dois correm da meta até um ponto e regressam à meta e recebem como prémio uma rosca de pão; a galhofa, uma luta também entre dois rapazes; e, em Vinhais, há a encamisada, uma ronda nocturna com música e mascarados".
António Tiza confirma que todos os rituais que acontecem nestas manifestações provam o que os homens devem ter e ser na vida adulta: destreza e resistência, secretismo e gentileza. "São rituais de iniciação ou de passagem. Têm que mostrar isto tudo".
As festividades têm, em várias aldeias, a presença de mascarados mas não é obrigatório. Contudo, António Tiza está convicto que nem sempre assim foi e que noutros tempos os caretos integrariam todas as celebrações onde quer que acontecessem. "Não se vislumbra grande diferença entre a baixa lombada e a alta lombada. Guadramil teve uma festa com máscaras, se Guadramil teve, se teve Rio de Onor tem, Varge tem, Baçal e Aveleda também têm, não se percebe porque Babe, São Julião e Deilão não tivessem tido".
As celebrações do primeiro ciclo das festas de inverno têm vindo a ser recuperadas em vários pontos da Terra Fria. Pinela, em Bragança, foi uma das localidades que quis devolver a festa ao povo. A celebração foi recuperada há meia dúzia de anos e tem como essência um charolo de roscas, que também existe em Parada e Outeiro. Ainda assim, com ou sem o rosto a nu, a Terra Fria vive, por estes dias, celebrações, cuja origem se perde na memória do tempo, que são como que um cartão de identidade destas nossas terras.
Escrito por Brigantia
Foto: António Tiza