Moradores da Burga recusam-se a deixar de usar água "milagrosa" da nascente

PUB.

Qua, 20/03/2024 - 08:59


Os moradores da Burga, no concelho de Macedo de Cavaleiros, estão revoltados porque lhes tiraram a água da nascente

Esta água abastecia parte da população e foi trocada por a de um furo artesiano. O município justifica a troca com níveis elevados de arsénio na água da nascente que podem pôr em causa a saúde pública.

Os habitantes estão num verdadeiro ataque de nervos com a troca de águas. Queixam-se que a água furo não é boa para consumo e que até já se sentiram mal por a beberem.

 “Com a água do furo sinto-me logo mal e vou logo à casa de banho e com a outra água isso não acontece”, disse o morador Ernesto Costa.

Também a moradora Fernanda Correia se queixa da qualidade da água do furo. “Nós colocamos a água do furo no garrafão hoje, amanhã já tem lixo no fundo”, reclamou.

Maria do Amparo, uma das moradoras à frente do protesto, diz mesmo que a água do furo não é clara. “De manhã levantei-me, estava a tomar banho e olho para baixo e disse ‘eu não tenho esta sujidade’. A água era amarela e cheia de porcaria”, contou.

Dulce Azevedo queixa-se do mesmo. “A água não é boa, não presta, sai escura, parece telha. No outro dia o meu pai bebeu-a da torneira e teve dor de barriga”, disse.

O município de Macedo de Cavaleiros está a abastecer a população com água de um furo artesiano. No entanto, a população recusa-se a usá-la e várias pessoas continuam a ir buscar a da nascente.

“Estamos habituados à água da nascente e é com ela que nos sentimos bem, é ela que nos tira a sede”, vincou Fernanda Correia.

Os moradores dizem que sempre souberam que a água tinha mais arsénio que o habitual, mas nunca fez mal a ninguém. “Os meus avôs e bisavôs diziam sempre que água tinha ferro, não chamavam de arsénio, e não faziam mal nenhum. Morreram todos perto dos 100 anos”, referiu Maria do Amparo.

E recusam-se a usar a água do furo artesiano. “Eu vejo aqui à torneira buscá-la. Ainda ontem enchi sete ou oito garrafas, dois ou três garrafões. Faço a comida com ela e bêbedos e com a outra não”, disse Dulce Azevedo.

O vice-presidente da câmara de Macedo de Cavaleiros esteve, nos últimos tempos, à frente deste processo. Esclareceu que foram feitas análises à água da nascente e que os valores de vários metais, de manganês e arsénio aumentaram. Por isso, não havia outra decisão a tomar. A água da nascente foi trocada por água de um furo artesiano.

Rui Vilarinho disse que a câmara não volta atrás na decisão. “Não vamos facilitar e vamos manter a decisão que tomámos, a não ser que a delegada de saúde faça análises à outra água e constate que já está novamente boa e melhor do que esta e nós invertemos a situação, mas é uma coisa que não nos parece expectável”, vincou.

Parte da população da Burga já é abastecida por um furo há cerca de 20 anos e a outra parte era abastecida pela nascente. Agora, tanto uma como outra são abastecidas por furos, sendo que, com a troca, foi feito um novo furo artesiano.

Rui Vilarinho disse que não há falta de água, como alguns moradores se queixam. Há sim um boicote, conforme esclarece. “Segundo dados que me são fornecidos pela Junta de Freguesia e pelas pessoas com bom senso, há prevaricadores. Como não têm contadores, abrem as torneiras durante a noite e é normal que, cinco ou seis casas, com torneiras abertas, um depósito de 50 mil litros, em três ou quatro horas, vem ao nível zero”, disse.

A câmara vai ainda colocar contadores. Rui Vilarinho considera que a resistência por parte dos moradores não se prende com o facto de se começar a pagar água. Tem a ver com hábitos, já que as pessoas acreditam que a água é abençoada.

Segundo o boletim das análises enviados pelo município de Macedo de Cavaleiros, ao Jornal Nordeste, a água da nascente, no período de ensaios entre 31 de Janeiro e 2 de Fevereiro, tinha níveis de arsénio superior a 41 µ/L. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a água para consumo humano deve ter, no máximo, 10 µ/L.

Escrito por Brigantia

Jornalista: 
Carina Alves/Ângela Pais